Alexandre, eu, Cosme e Ramon e o “gaizel”
De volta à fazenda…
Começo mais uma viagem pelo túnel do tempo.
Antes dessa imersão, pergunto-me novamente o motivo pelo qual a década de 70 está tão fortemente marcada em minha memória. Período entre o se por da infância e o despertar e o passar da adolescência.
Época de descobertas, crescimento, amadurecimento, experimentos. De realizações, conquistas e também perdas. De mudanças, de sentimentos e de sensações em turbilhão. Temores, rebeldia, frustrações, desejos estiveram presentes. Sem dúvida, época de solidificação dos alicerces fundamentais para a sustentação dessa construção chamada vida.
Marcante que foi, viajo novamente em busca das boas lembranças desse construir. Em sua maioria, momentos de muito aprendizado, alegrias e felicidade.
Portanto, busco agora ordenhar minha memória, para extrair imagens que ficaram da minha convivência na fazenda de um dos meus tios, do qual falarei com mais detalhes. Lembranças boas, que parecem confinadas num curralzinho interior, à espera dessa ordenha, para meu deleite e, quem sabe, daqueles que comigo compartilharam essas vivências, aos quais, com carinho, dedico essas minhas memórias.
A natureza com seus múltiplos elementos, cores, cheiros, sabores e sons encanta, atrai, seduz. Fazenda, roça, sítio, mato, seja qual nome for. Sempre gostei.
Longe de qualquer ambição literária, vou cavalgar pelo passado, sempre privilegiando o simples e o lúdico. Escreverei em tópicos, buscando agrupar as recordações por temas afins. Não me preocuparei em sequenciar os fatos cronologicamente. Virão ao léu, à medida em que as porteiras forem se abrindo.
Vamos lá, a fazenda nos espera…
Foto ilustrativa
A fazenda
Durante boa parte da minha infância e adolescência, todo final de semestre era assim. Ansiosos para o início das férias e já pensando na fazenda, enfrentávamos as últimas atividades escolares.
Então de férias, tínhamos um só destino: a fazenda do tio Itamar. Normalmente íamos eu, minha irmã Silmara e meu irmão do meio, Renarde. Os dois irmãos mais novos, Ramon e Júnior, nos acompanhavam eventualmente. Umas poucas vezes, a minha mãe, Dona Geralda, também nos acompanhou.
O tio Itamar – quando crianças o chamávamos de “Ti Tá” -, era casado com a tia Natalícia (infelizmente já falecida). Tinham quatro filhos. Os dois mais novos nasceram ao longo da década de 70. Assim, nossa convivência era mais forte com os primos mais velhos, Kátia e Alexandre.
Primeiro dia de férias e já esperávamos pelo convite. Feito o chamamento, já com as trouxas prontas, seguíamos para o nosso refúgio de férias. No início, sempre viajávamos com os tios. As primeiras viagens foram a bordo de uma Vemaguet. Muitas outras na traseira de uma caminhonete. Mais ao fim da década, íamos sozinhos, de ônibus ou de trem. Eu gostava muito de ir de trem, apesar do maior tempo de viagem.
A fazenda ficava no município de Engenheiro Navarro. Logo após o trevo de entrada para aquela pequena cidade, pegávamos uma saída à esquerda, numa estrada vicinal, de terra, é claro. Até chegar a fazenda, comíamos poeira, literalmente, principalmente quando a viagem era feita na carroceria da C10. Algumas vezes, fomos a pé, da rodovia até a fazenda, caminhando aproximadamente uns 7 quilômetros.
Toda fazenda tem um nome, mas não me lembro do nome da fazenda do tio Itamar. Chamávamos simplesmente de “fazenda de Ti Tá”.
A propriedade ficava num descampado, logo após passarmos por uma pequena ponte de madeira e enfrentarmos uma subidinha (na época das chuvas dava um pouco de trabalho para chegar ou sair dali).
A casa sede, tinha uma varanda na parte da frente. Adentrando a casa, um quarto logo a direita onde normalmente dormiam as meninas e uma sala de “visitas”. Seguindo, a sala de jantar e o quarto dos tios. Na sequência o banheiro e um pequeno quarto onde normalmente dormiam os meninos.
Aos fundos, uma cozinha bem típica das fazendas, com seu fogão de lenha, uma bancada com a pia e paredes enegrecidas pela fumaça. Geminada à cozinha, uma área cercada por um murinho, onde fazíamos as refeições numa ampla mesa de madeira, com dois grandes bancos de cada lado. Havia também um quartinho, onde dormiam a Dona Madalena e o Cosme.
Mais ao fundo ainda, um pequeno paiol, um mangueiro cercado por velhas lascas de madeira, quase nunca utilizado pelos animais e uma barroca, coberta por vegetação fechada, a qual chamávamos de gruta. Fizemos algumas incursões exploratórias naquele buraco. Pura aventura.
Na frente da casa, um pequeno gramado. Ao lado da sede, a casa dos empregados e um pequeno espaço para depósitos tralhas diversas e mantimentos para os animais.
Mais a frente, ainda, ficavam os currais. Eram três divisões, incluindo a casa de curral. Quanto tempo me dediquei a vaguear pensamentos sentado na cerca daquele curral, ora observando os animais, ora a paisagem daquele cerrado típico do norte de Minas Gerais, ora o nada.
No curral havia um cocho onde os animais bebiam água. Algumas vezes arriscamos um banho ali. Saíamos verdes, cobertos pelo lodo que pintava as paredes do cocho.
Há uns cem metros da frente da casa, havia algumas árvores bem frondosas, das quais roubávamos um pouco do frescor das sombras nas tardes calorentas daquelas bandas.
Em uma das laterais, uma caixa d’água, suportada por uma estrutura de madeira e um caramanchão onde descansava uma parreira. Uvas azedas aquelas…
Havia algumas árvores frutíferas espalhadas pelo terreiro e imediações.
O piso da casa sede era de cimento queimado, ornado ao vermelhão. Energia elétrica não havia ali. Utilizavam-se lamparinas e lampiões. Lembro-me que, no quarto dos meninos, dormíamos observando o rebolar da chama da lamparina, que em sua dança, misturava sombras que atiçavam fantasias tenebrosas nas jovens mentes daqueles meninos. Acordávamos cutucados por longos e finos dedos de luz, formados com a passagem dos raios de sol pelas frestas do velho telhado do quartinho.
Tinha geladeira sim, só não me lembro se energizada a gás, querosene ou bateria. Acho que era a gás. Meu tio tinha uma pequena televisão, de imagem em preto e branco. Naquele local isolado, o chuvisco dominava a programação. A TV era ligada na bateria da caminhonete. Quantas vezes de manhã éramos chamados a empurrar o veículo para que pegasse no tranco. Bateria consumida pela televisão.
O chuveiro era temperado ao calor da serpentina. Água quente, morna ou fria, a gosto do freguês. Chique!! O banheiro. Lembro-me sempre do cheiro matinal do creme dental Kolynos, com fluor. – Não deixem de escovar os dentes! Recomendava meu pai antes das viagens.
Permanecíamos naquela fazenda por quase todo o período das férias. Tio Itamar e tia Natalícia, a quem registro meus sinceros e eternos agradecimentos, nos recebiam sempre muito bem e nos tratavam como verdadeiros filhos adotivos por temporada. Doces eram as nossas férias naquela fazenda!!
– Larga de eu soudade! Diria o matuto em plena melancolia.
Adiante, falarei das pessoas, dos bichos, das plantas, das comidas e do que mais for me lembrando…
No final dos anos 70 a fazenda foi vendida. Passamos a frequentar a casa do tio Itamar em Navarro, onde ele montou uma mercearia. Ótimos tempos também, mas, quem sabe, a serem lembrados em outros causos.
Tio Itamar (“Ti Tá”). Foto atual
As pessoas
Além do tios, Itamar e Natalícia, dos primos Kátia, Alexandre, Júnior e Débora, tínhamos outros moradores na fazenda. O Itamar sempre foi um brincalhão, muito bem humorado e com uma tremenda presença de espírito. Não tinha como não gostar da sua companhia. A tia era muito carinhosa conosco. Às vezes ficava nervosa, mas nunca comigo, graças a Deus! Os primos sempre foram mais tímidos, mas sempre grandes companheiros. Éramos como irmãos.
O Assis era um jovem que vivia com os tios e ajudava em diversas tarefas, inclusive na cozinha. O Cassimiro era o vaqueiro e morava com sua esposa, tratada como Irmã Lia (evangélica) e os três filhos, duas meninas e um menino. Vaqueiro de cara fechada, pouca conversa. Mas nos auxiliava sempre que precisávamos, arreando os cavalos para uma voltinha na fazenda. Tínhamos pouca interação com a Irmã Lia e com os seus filhos.
Sílvia e Cida, trabalhavam nas tarefas domésticas. Sílvia um pouco mais séria, fechada., mas se soltava quando ligava a sua radiola e ouvia Love Hurts do Nazaré. Cida, um doce em pessoa, de fala baixa e sempre solícita. Nunca dizia não aos nossos pedidos.
Durante um tempo, também morou por lá a Dona Madalena, que também auxiliava nos trabalhos da casa, e seu filho Cosme (o santo que salvou Renarde), com quem dividíamos várias das nossas aventuras e brincadeiras.
Doces são as lembranças das pessoas que viviam naquela fazenda…Ah, tinha também o Brito e o Quelé, que prestavam serviços eventuais na fazenda. Moravam ali por perto. Brito, o bruto, cara fechada, atarracado, de força descomunal. Lembrarei dele quando falarmos das comidas, pois o seu almoço, ainda cedo do dia segundo costume da roça era servido numa imensa gamela esmaltada. Não sobrava nada… Quelé, possivelmente Quelementino, no registro Clementino, magro, alto, boa praça.
De quando em vez, recebíamos visitas na fazenda. Primos, amigos, avós,…Nessas ocasiões era uma festança de dar gosto, sempre enriquecidas com muitas brincadeiras, muita conversa, muita comida e muita bebida.
O famoso Cortezano
As investidas pela vizinhança
Nas proximidades da fazenda havia um pequeno riacho, sobre o qual ficava a pequena ponte de madeira que dava acesso a propriedade. Costumávamos ir lá de vez em quando e até arriscávamos um banho no pequeno córrego. Saímos mais sujos do que limpos, dada a concentração de calcário e argila naquele local. Tão logo entrávamos, a água se tornava turva, em tons marrons esbranquiçados. Mas era refrescante e divertido.
Em dias de muita chuva, aquele inofensivo córrego tornava-se traiçoeiro. Lembro-me que que em um desses dias de raras chuvas torrenciais, explorávamos a parte do córrego que passava debaixo da ponte. Enfrentando correnteza forte, água barrenta, meu irmão Renarde caiu num buraco e quase submergiu. Como um periscópio, ergueu o braço acenando em desespero, sendo puxado e salvo pelo amigo Cosme. Susto dos grandes!
Córrego acima, andando por cerca de uns 2 quilômetros chegávamos a fazenda do seu Higino. Lá, lembro-me de um engenho movido por um sonolento boi de carga, onde sempre faziam rapaduras. Aproveitávamos para apreciar a garapa e a puxa, derivados da cana, antes de se endurecerem em rapaduras.
Seguindo estrada afora, chegávamos a venda do Antônio Virgílio. Se me lembro bem, era um pequeno comércio mantido em sociedade com o Tio Itamar. Muitas vezes passamos a tarde lá, jogando sinuca. Não sei se o Antônio tinha aquela cara brava por natureza ou se não gostava da bagunça que fazíamos. Sisudo.
Em algumas ocasiões, saímos da fazenda a noite e seguíamos a pé, em fila indiana, por estreitos caminhos naquele cerradão, em direção à venda. Tia Natalícia puxando a fila, Cida e Assis na escolta e a meninada atrás. Geralmente íamos em busca das festas com forró, regados a sanfona, farofa de frango e Cortezano. Acho que foi numa dessas que tomei o meu primeiro porre, aos 12 ou 13 anos de idade.
Mais um pouco distante, existia uma outra fazenda, cujo nome do proprietário era Seu Max, acho eu. Lembro-me de um vaqueiro, que chamávamos de Zorro. Provavelmente esse não era o nome dele, mas uma alcunha pela prática de empinar o cavalo, a exemplo do que fazia o herói mascarado, para delírio da meninada.
Mais distante um pouco ficava uma região que chamávamos de serra. Meu tio também tinha terras ali. Nas proximidades moravam o Brito e o Quelé.
Era uma região bonita com muito pasto e um paredão de serra ao fundo. Azulado. Local pouco habitado naquela época. Algumas vezes achamos alguns barbeiros, aqueles besouros perigosos, na casa do Brito. Preocupada ficava a tia Natalícia, que logo encomendava um banho de BHC – sim naquele tempo isso ainda era utilizado – para o telhado da fazenda.
Frequentemente, saímos de carro até a cidade de Engenheiro Navarro. Enquanto os tios resolviam negócios ou faziam visitas aos amigos, nós, a meninada, aproveitávamos os bares e a “boate” do Aroldo. Lá experimentamos as primeiras paixões da infância e adolescência, embalados ao som de Benito de Paula, Júlio Iglésias, Pholhas, Bee Gees e muitos outros. Voltávamos já bem tarde para a fazenda, muitas vezes na carroceria da caminhonete. Nas férias de julho, nos embolávamos naquela traseira, buscando proteção para o frio cortante. Chegávamos exaustos, empoeirados, mas felizes pela aventura na cidade vizinha.a
Foto ilustrativa
Os bichos e as plantas
O terreno próximo à sede da fazenda não era propício à plantação. Alguns arriscavam algumas hortas ou pequenas lavouras de mandioca e milho próximo ao córrego. No mais, ali por perto a terra era dura, seca, com muito cascalho, recoberta por uma vegetação rala e espaçada, parecida com a vegetação de carrasco, comum na região nordeste. Aqui e acolá encontrávamos uma ou outra árvore mais frondosa, refugio sagrado para nós e para os bichos nos dias de sol a pino. Para as plantações com objetivo de uma maior produção, eram utilizadas áreas longe da sede (algumas ao pé da serra).
Perto da casa, havia algumas pés de frutas. Amora, manga, limão, laranja, pinha para consumo local. Uma valente parreira teimava em exibir pequenos cachos de uva. Bem azedinhas por sinal. Araçá! Lembro de vários pezinhos da “goiabinha”. Despistava a fome nas nossas longas caminhada pela região.
Logicamente, encontrávamos alguns pés de pequi, espalhados pela região. No mês de janeiro, era comum sairmos em comitiva a cata do precioso fruto.
Os bichos. Eram vários. Bovinos, alguns poucos equinos e muares, um casal carneiro e ovelha, poucos suínos. Uma pata, várias galinhas e uns poucos galos. Cocás, que depois fui entender por galinha d’angola. É claro, não posso me esquecer dos cachorros. Acho que tinha um gato também.
Inesquecíveis aqueles amanheceres ao som dos bezerros e das vacas num diálogo recíproco. Era hora de corrermos para o curral e ficar a observar a ordenha das vacas. Cocás em seu cacarejar frenético também comemoravam o início de mais um dia. Porcos, galinhas, pato…Todos pareciam querer bater ponto nas manhãs.
Lidávamos muito com os cavalos, pois adorávamos uma cavalgada pelos arredores. Algumas quedas foram cinematográficas. Faz parte…
Tinha o Mil Contos, um baio bem alto, extremamente dócil. Era o preferido dos iniciantes na arte de cavalgar. Tinha o Navio, já mais arisco e preferido pelos vaqueiros. A égua C10, garbosa, marchava quase que se ajoelhando. Boa de passo. Tinha um cavalo gazo, que chamávamos de “gaizel”. Muito manso, mas sistemático. Volta e meia empacava, dando trabalho para retomar a marcha. Tinha um outro esbranquiçado, de marcha dura, xotão, do qual não me lembro do nome. Ninguém gostava.
Castelo Branco! Esse era o nome do burro – coisas do tio Itamar – que era usado para puxar a carroça. De cara fechada, também cismava de vez em quando e ficava imóvel. Quem melhor se entendia com ele era o meu Tio Sebastião (o Tião), que, ao visitar a fazenda, sempre nos conduzia num divertido passeio de carroça.
Havia vários cachorros que sempre nos rondavam. O Tocão, de porte imponente, coloração cinza escuro. Impunha respeito, mas era bem amigável e gostava de um afago. No entanto, era inimigo número um do Manda Brasa, um pé duro de cor caramelo mesclado com branco. Era amicíssimo do tio Itamar. Eram comuns as brigas dele com o Tocão, na disputa de pedaços de ossos ou de carne, durante as nossas refeições.
Os pequineses Watson e Kelly. O Watson era extremamente chato. Ninguém podia chegar perto do Itamar. Ele virava uma fera e se não nos cuidássemos mordia mesmo. A Kelly, bem mais calma era a xodó das meninas. Acho que havia outros, mas com certeza não foram tão protagonistas como esses que mencionei, pelo menos nas minhas lembranças.
O barrão, porcão rosado era casado com a porcona, que não tinha nome, acho. Várias ninhadas nasceram naqueles anos de convivência na fazenda. Lembro-me de nossas tentativas de salvar alguns porquinhos recém nascidos, expulsos pela leitoa por estarem machucando as tetas com seus dentes já pontiagudos e afiados. Na maioria das vezes não lográvamos êxito na tentativa de salvamento e os bichinhos acabavam morrendo. Alguns que se salvaram, tinham destino certo nos nossos natais. Carnívoros!
Bandos de cocás frenéticos se misturavam aos galos e galinhas. Ovos estavam sempre garantidos nas nossas refeições.
O pato ou pata, não tenho certeza, animava-se em longos voos panorâmicos. Até então eu não sabia que pato voava tão longe e tão alto.
Por fim, afora as diversas espécies de aves e pássaros soltos naquela natureza, tinham os bois, as vacas e sempre um garrote com cara de boi bandido. Sempre gostei do cheiro de curral, do mugir dos bezerros a procura do alimento materno. Da resposta das mães acalentando os rebentos. Do aboiar do vaqueiro, tangendo o seu gado. Eiiiiii boi!!!
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As comidas
Fazenda é um lugar onde se come bem. E muito!!!! Na fazenda da tia Natalícia não era diferente. Mestre da culinária rural, por ter nascido e crescido naquele ambiente, ela nos encantava, e nos engordava, com as suas receitas.
Começo pelos almoços e jantares. Sentados à grande mesa de madeira, aguardávamos famintos os “pratos feitos” preparados pela Sílvia e Cida ou Dona Madalena. A refeição era quase sempre constituída de um feijão misturado na farinha de mandioca, coberto por uma generosa porção de arroz, verdura e uma carne, as vezes bovina, outras um franguinho caipira, outras vezes carne de porco. Um ovinho caipira frito era sempre bem-vindo. Delícia!!!
O café da manhã, sempre com queijinho da roça, produzido ali mesmo, as vezes requeijão, também de fabricação própria, ovos e pão sovado. Ah, biscoito também, claro. Havia um forno de barro na fazenda. O café era ralo e doce, chamado de garapa. O leite fresco estava sempre a disposição. Na época da safra de milho, surgiam as deliciosas pamonhas. Tinha também o famoso pão jacaré, comprado na padaria do pai do Aroldo (aquele mesmo da boate), lá em Navarro. O bicho chegava inteiro, mas era dissecado em segundos pelo apetite voraz daqueles meninos e meninas. Até hoje não sei como o seu Itamar dava conta de sustentar aquela tropa.
Aliás, acordar com aquele cheirinho de café, misturado à fumaça do fogão a lenha, hum…Que saudade!
Muitas vezes a meninada era convocada para auxiliar na confecção das preciosidades da culinária “nataliciana”.
Doce de mocotó. Ajudávamos a mexer o tacho com aquela “gosma negra” que parecia indigesta no preparo, mas se transformava num doce precioso depois de pronto. Gosto demais, até hoje.
Pamonha. Era época de colheita do milho ainda verde. Mingau, pamonha ou assado na brasa do fogão era o destino das espigas, que chegavam aos montes conduzidas na carroça do Castelo Branco. Linha de produção: descarregar; debulhar com cuidado para não estragar as futuras embalagens; tiras os cabelos das espigas; ralar; embalar na palha do próprio milho; amarrar e cozinhar. Pronto. Era cada pamonhão de encher o bucho por um dia. Gostava muito de comê-las no alto do pé de manga, situado na lateral da casa do vaqueiro Cassimiro. Levava horas degustando aquela preciosidade. Comer devagar, né? Senão acaba logo…
Requeijão. Leite no tacho de cobre. Mexe e mexe e mexe, por horas. Depois colocar nas formas. Deliciosos tijolos de leite e gordura. Mas o melhor era a hora de raspar o tacho. Autorização recebida, cada um com sua colher, cercávamos o tacho para coleta das raspas de requeijão. Antes jogávamos um pouco de açúcar cristal que misturado ao queimadinho do requeijão produzia um sabor inigualável. Água na boca…
Pequi. Gosto muito! Saímos pelos arredores da fazenda a cata do fruto. Logo estávamos sentados com um prato de pequi com arroz. Como bons norte mineiros, roíamos até apontarem os espinhos. Coisa de menino raiz…
Frutas diversas da região, queijo, milho cozido, mingau de milho, doce de leite, doce de mamão, de figo…Era muita fartura naquela fazenda!