É um pequenino distrito da cidade do Serro – MG, lá no alto Jequitinhonha. Chega-se lá pelo Serro ou por Diamantina. Caminho sempre repleto de belezas naturais, muitas montanhas e vales. Vez ou outra o velho Jequitinhonha se exibe, feito uma anaconda, serpenteando e brincando de esconde esconde trecho ao longo.
De marcada arquitetura colonial, típica das vilas e antigas cidades do interior das Minas Gerais. Casinhas coloridas, ruas de terra ou de rústico calçamento em pedras, ladeiras e mais ladeiras. Pequenos cursos d`água. Pequenas, simples, mas agradáveis pousadas, alguns botecos de simples, mas deliciosos petiscos, boa cachaça curraleira e cerveja gelada. Vi apenas uma padaria e uma farmácia.
Ah, o virtual já chegou por lá… Pode se conseguir hospedagem até pelo Airbnb!!! Sinal de voz e dados ainda precários, ainda bem! Pois é lugar para utilizarmos a principal função dos nossos smartphones: fotos e vídeos. Motivos não faltam: paisagens, flores, plantas, bichos, casas e construções antigas e rústicas. Televisão naquele lugar? Nem pensar, deveria ser proibido!
Já estive por lá três vezes. Meus irmãos, algumas várias. Gostamos muito, mas nada se compara ao gosto demonstrado pela minha mãe. Segundo suas contas, já esteve por lá mais de dez vezes!
Entendo a Dona Geralda. Lá parece que ela se transporta para uma outra dimensão de tempo e espaço. Parece voltar a pisar nas terras brancas de beira Jequitinhonha. Percorrer antigos caminhos marcados pela impressão dos seus jovens pés descalços na superfície molhada da beira do rio. Parece estar sobre um galho de jabuticabeira, admirando o tudo e ao mesmo tempo o nada, naquele vai e vem gostoso de quem aprecia viajar sobre o chacoalhar do trem dos sonhos.
Lá não a vejo queixar-se de nada. Não tem dor de coluna, no ombro, de cabeça. Não tem olho irritado, dor na perna. Clara inversão da chave do humor. Vejo a sorri, conversar com os locais com entusiasmo de uma exploradora de novos mundos. De lá ela não quer sair…
Percebo que essa transformação observada na minha mãe é contagiosa. De certa forma, todos nos sentimos muito bem naquele lugar. Provavelmente, por conseguirmos, pelas belezas e pela tranquilidade, guardar temporária distância física e mental da nossa rotina de vida diária.
Visita a Milho Verde
Milho verde é também um distrito do Serro e dista cerca de uns seis quilômetros de São Gonçalo. Muitos fazem o caminho a pé. A exemplo de seu distrito vizinho, milho verde guardar ares de antiguidade e interior. Tem uma igrejinha muito bonita que fica ao lado do cemitério da cidade e bem próxima de casas, estabelecimentos comerciais, inclusive botecos. A topografia é bem mais plana em comparação à São Gonçalo.
Lá há várias opções de cachoeiras. Tem o lajeado, um imenso corredor de pedras escuras e areia branca. Água turva, marrom-avermelhada, temperada mais a frio. Volta e meia, encontram-se pequenos banheiras naturais onde podemos nos deliciar com um refrescante banho. Ao longo do lajeado, encontramos algumas cachoeiras. A vegetação é maravilhosa, num misto de cerrado e carrasco. Muitas bromélias, flores silvestres, sempre-vivas, cactos, arbustos retorcidos…
Diversão e comilança
Num lugar igual à São Gonçalo, as opções de diversão não são muitas, comparando-se aos acostumados aos ambientes cosmopolitas. Ao contrário, é lugar sossegado para quem quer sossego. É lugar de largar o carro na pousada e caminhar, descida abaixo, ladeira acima, sobre terra e pedra. Deixar a pressa para trás, em passos lentos, pois as ruelas e trilhas são bastante irregulares.
Lugar de sair cedo, contemplar a natureza, visitar locais próximos em busca dos córregos e das cachoeiras. Depois, sentar num boteco ou na “famosa” pizzaria local – por sinal a pizza e a caipirinha são maravilhosas. Ambiente apropriado, também, para se degustar taças de um bom vinho. Comer e beber.
Há sempre uma boa comida mineira, caseira, que pode ser acompanhada de apetitosos tira-gostos de entrada. Uma cachacinha curraleira é sempre bem-vinda. Que tal uma porção de torresmo, uma linguicinha caipira? Cerveja gelada ou caipirinha ou até um bom suco de frutas para os que não são do álcool. Para os que amam, há também boa variedade de doces caseiros e condimentos em compotas.
O atendimento nos estabelecimentos é invariavelmente cortês. Gente simples, humilde que demonstra prazer no exercer do ganha pão e do servir.
Alimentados, o corpo nos leva a uma deliciosa siesta para lá das três ou quatro da tarde. É levantar novamente e sair a caça das bonitezas de São Gonçalo. Preparar o físico para mais uma noitada de comilanças e goles.
Fim de tarde no vale encantado
Após a recomendável soneca da tarde, uma boa pedida é visitar um local que a minha mãe me apresentou como “vale”. Não sei se esse é o nome oficial! Segue-se por uma estreita ruazinha de terra, recheada de casinhas coloridas, todas enfeitadas com algum tipo de pé de fruta ou de flor. São Gonçalo das Flores, poderia assim ser chamado.
Ao fim da rua, avistam-se as últimas casa e uma pequena casinha em lindo azul e branco que abriga uma roda d`agua que move ou já moveu um moinho. Tem-se então um córrego, uma pontezinha de madeira que dá acesso a um paredão imenso de pedras escuras, terminando em um precipício que dá início ao “vale”. O córrego, antes de descer precipício abaixo, nos brinda com uma pequena, mas linda e gostosa cascata. Água fria para um revigorante banho de corpo e alma.
Dependendo do ângulo em que se observa o córrego desaguando em cascata, tem-se a visão de uma pequena piscina de borda infinita. Além d’agua só a visão da imensidão
verde, recheada por uma formação de serra ao longe.
Quando mais nublado, as grandes nuvens, como moldes em algodão doce, formam figuras na tela do céu que atiçam a nossa imaginação.
Nos dias de chuva, o vale é recoberto por uma bruma branca, que se desloca em câmera
lenta, ao sabor das correntes de vento.
Espetáculo imperdível é o por do sol naquele vale, principalmente quando temos nuvens ao
longo do horizonte. É uma verdadeira mescla de cores e tons. De um bege-amarronzado para um amarelo-laranja azulado… O sol, ciente de sua imponência e belezura, desce preguiçoso, se exibindo aos olhos e lentes boquiabertas. Quase impossível de descrever.
Visitar aquele lugar me faz pensar na magnitude dos micros e do macro universos que nos
cercam. Na nossa insignificância diante de tanta grandeza. Convida-me a um estado
de constante contemplação. Leva-me para o sonhado país das maravilhas que vejo nos olhos da minha mãe quando ali está.
Elementos em sintonia, corpo, alma, terra, água, ar! Bom, tem o fogo noturno das caipirinhas!
Encantos de um vale encantado! Encantos de um lugar encantado!
São Gonçalo do Rio das Pedras. Voltaremos!!
Por Anderson Nobre