Dia desses, organizando meus arquivos de imagens, deparei-me com a foto de uma pedra sobre uma enorme formação rochosa. Foto que eu havia registrado em uma localidade próxima à Diamantina – MG.
A pedra, brincando de equilibrista; desafiando os curiosos a descobrirem qual a origem daquela formação. Parece ter sido colocada ali por mãos divinas, cuidadosas, bem devagar, garantindo um estado de equilíbrio.
Poucos metros à esquerda, a pedra cairia e se fragmentaria. Poucos metros à direita, seria apenas uma rocha sobre outra, sem nenhum despertar de curiosidade.
Equilíbrio. Palavra que o dicionário define como “posição estável de um corpo, sem oscilações ou desvios.” Sim, aquela pedra está em perfeito equilíbrio!
Veio-me a mente a lembrança da clássica fábula de La Fontaine – dizem que o conto original é de Esopo, na antiga Grécia -, “A cigarra e a formiga”.
Conta-se o descaso da cigarra com a realidade da vida, ao dedicar-se apenas a arte da cantoria, enquanto a formiga, incansável, labutava em busca de alimentos, formando reservas para o inverno, época de severa escassez de alimentos. A formiga, enquanto trabalhava, alertava a cigarra sobre a necessidade de se preparar para o inverno que se avizinhava. Ao final, a cigarra, antes despreocupada, é obrigada a solicitar abrigo e comida à formiga, sucumbindo ao rigor do inverno e desculpando-se por não ter ouvido os conselhos da formiga.
Certo não ser esse nosso viver um elemento estático, como aquela pedra da fotografia, normais e corriqueiros serão as oscilações e os desvios.
Seria então a busca do desejado equilíbrio o segredo do bom existir? Equilíbrio entre razão e emoção, trabalho e diversão, corpo e espírito, cigarra e formiga?
Desequilíbrio. Percebo isso em nossa convivência. Uns pendendo para o extremo formiga, outros para o cigarra.
No extremo formiga, preocupados, operários. Trabalham, acumulam, guardam pra os seus. Conjugam predominantemente o verbo TER!
Extremo cigarra, despreocupados, sonhadores, buscam descanso, diversão e arte. Predomina o verbo SER!
Vejo virtudes nesses comportamentos ditos antagônicos, mas, bom seria se conseguíssemos estar numa constante metamorfose entre o estado formiga e o estado cigarra.
Que triste das formigas sem as cigarras. Onde encontraríamos espaço para o imaginativo, o criativo, o lúdico, o artístico, o belo, o sedutor, o encantador, o etéreo…? Quando nos deleitaríamos viajando em sonhos e fantasias? Como alimentaríamos o espírito?
Que flagelo, imagino, as cigarras sem as formigas. Onde encontraríamos abrigo, alimento e segurança? Quando nos ocuparíamos com o trabalho, com as responsabilidades, com a saúde, com as necessidades de segurança, com o sobreviver, com os custos do estado cigarra…? Como alimentaríamos o corpo?
Clara para mim a necessidade de busca constante do equilíbrio entre o TER e o SER. Não há ser sem TER. Não teremos sem SER. Estados complementares, mutuais, essenciais.
Desde de mais jovem, meu pensamento pende sempre para o meu lado formiga. Talvez por ter visto a batalha dos meus pais para criarem os cinco filhos. Depois, constituindo família e assumindo diversas outras responsabilidades. Corpo saciado!
Provavelmente, e por muito tempo, esteja relegando o meu lado cigarra. Espírito faminto!
Desequilíbrio meu…
A busca constante pelo centro de gravidade desses estados talvez seja a receita para acrescentarmos um outro significado à palavra equilíbrio: Felicidade!
Por Anderson Nobre