Foto: Anderson Nobre - Um Mil Réis

Quanto vale "Um Mirreis"?

Visitando o meu sogro agora no Carnaval, resolvemos dar uma olhada na pequena coleção de moedas e cédulas antigas que ele guarda com carinho.

Começamos a olhar cada um dos objetos, curiosos em verificar a data da emissão. Alguns eram bem antigos, datados do século XIX.

Conversa vai, conversa vem, acabei sendo gentilmente presenteado com uma cédula de “Um Mil Réis” e uma moeda de 2.000 réis. Peças bonitas, emitidas no início do século XX (imagem da cédula está reproduzida na foto que ilustra esse texto).

A nota traz expressões com grafia antiga, como “Thesouro Nacional” e “Estados Unidos do Brazil”. Achei curioso é a frase expressa na nota “se pagará ao portador desta a quantia de”, caracterizando o legítimo título de crédito ao portador.

Fiquei pensando sobre o porquê do meu fascínio por objetos antigos. Aquele velho rádio à válvulas, o velho baú forrado em couro, a velha máquina de costura,  a antiga máquina fotográfica analógica, os surrados apetrechos de arreios, vasos, porcelanas, quadros, utensílios domésticos, fotografias, cédulas, moedas. Aquela balança de dois pratos da vendinha da esquina, a máquina manual de moer café da fazenda do tio, o velho Jeep Willys do vizinho, aquela radiola da casa da vó…

O interessante é que esse gosto nos remete a coisas bem mais antigas do que a nossa própria existência. Tempos dos nossos pais, avós, bisavós… Memórias de coisas não vividas mas sabidas, transmitidas pelo espalhar dos galhos da árvore do tempo.

Seria essa uma nossa necessidade de recuperar ou reafirmar as nossas raízes, nutridas pela seiva sintetizada num passado e que nos trouxe até aqui?

Seria um misterioso instinto de regressão, alimentado por memórias herdadas e gravadas na instigante sequência da genética da vida?

Seria mera admiração por objetos bem construídos, numa era em que as linhas de produção ainda conjugavam harmoniosamente mãos e máquinas?

Seria puro saudosismo, fruto das histórias e estórias ouvidas ao longo do tempo, que nos remetem a um época já remota, das coisas e gente mais simples. Ares de romantismo ou até mesmo de inocência?

Seria inconsciente resistência ao estilo descartável dos tempos de agora, onde predomina o  efêmero e o substituível. Inovação e renovação acelerando o consumismo desembestado. Usou, jogou fora!

Ou seria mesmo um processo natural do avançar da idade, onde o retrovisor passa a ser elemento constante em nosso dirigir?

Talvez um pouco de tudo isso…

Mas será esse apreço ao antigo restrito às coisas do mundo da matéria? E o imaterial, o invisível, o inconcreto, traduzidos em nossos modos de ser, de agir, de sentir? Estaríamos nós saudosos ou necessitados de uma viagem no túnel do tempo, de sorte a resgatar modos e práticas de outrora?

Aqueles almoços festivos em família, aos domingos de frango, macarrão e maionese. Aquelas rodas de bate-papo nas calçadas ou nos murinhos dos alpendres nas noites calorentas de verão. 

Aquele saudar cordial de bom dia, boa tarde e boa noite. As brincadeiras no recreio da escola. O pedir bença pros avós, pais, tios, padrinhos… O caminhar vagaroso, de mão dadas, pelas ruas e pracinhas. As visitas às casas dos amigos e parentes. Os banhos refrescantes nos rios, riachos e cachoeiras. O andar a cavalo. O andar descalço pelas ruas de pedras. O burburinho das peladas no campinho de terra, e muito, muito mais…

Volta e meia nos flagramos em  nostalgia, assistindo vídeos alusivos às coisas e aos modos de décadas passadas, que circulam como vírus pelas redes sociais e pelos aplicativos de mensagens. Por que?

Voltando à nota que ganhei de presente, pergunto-me quanto vale esse 1 Mirréis. Conversando com o atualíssimo e popular Dr. Google, soube que numa conversão hipotética 1 Mirréis equivaleria a aproximadamente R$ 123,00

Confirmei, então, que a minha imensa satisfação pelo presente que ganhei não se deve de forma alguma ao valor monetário da peça. O inestimável valor é puramente sentimental. 

Primeiro, em imensa gratidão à gentileza do meu sogro ao me presentear com uma peça subtraída da sua preciosa coleção. Obrigado seu João!! 

Segundo pelo real apreço que tenho pelo antigo. Por que?


Por Anderson Nobre

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